terça-feira, 4 de agosto de 2015

Castelo de São Jorge

O Castelo de São Jorge foi objeto do mais ousado projeto de restauro já alguma vez feito em Portugal, pelo que vale a pena ficar com as imagens do Sistema de Informação para o Património Arquitectónico [1] e do texto de António Miguel Godinho da Cruz [2]

Historicamente “nos primeiros anos de actividade os princípios norteadores das iniciativas da DGEMN junto dos monumentos nacionais, tal como no período antecedente, pautaram-se por uma reintegração arquitectónica, com base na pureza de estilo, sacrificando elementos de outras épocas, que eram considerados como atentados estéticos à harmonização dos edifícios” (Neto, 2001, p.236).

De facto a intervenção no Castelo de S. Jorge não se afastaria totalmente dessa premissa, pois a DGEMN optaria por construir novas estruturas, erguendo novas muralhas, destruindo casas, isolando torres e colocando ameias exaustivamente “com o fim de restituir ao Castelo de S. Jorge, senão a verdadeira fisionomia primitiva, a unidade, a grandeza e os mais eloquentes títulos do seu valor documental” (Castro, 1935-1990, 25-26, p.34), levando a que o Castelo fosse “restaurado de modo diferente relativamente às suas formas genuínas no Passado” (Santos, 2011, p.183). 

Mais do que intentar reconstruir o seu formato primitivo “a intervenção de restauro logrou transformar o Castelo de S. Jorge num edifício profundamente baseado na imagem cultural do castelo medieval português (…) dando ao edifício uma presumível estrutura idealizada, pertencente a um momento intemporal e que possivelmente o castelo nunca terá possuído” (Santos, 2011, p.184).






A intervenção realizada pela DGEMN de 1938 a 1940 incidiu, numa primeira fase, na expropriação e demolição de edifícios, nomeadamente de estruturas arquitectónicas posteriores à época manuelina - séculos XVII e XVIII - operações de desaterros e remoção de entulhos, abrangendo uma escala monumental que correspondeu a cerca de metade da área da freguesia do Castelo e ainda na sua área adjacente, exterior às muralhas, com maior incidência a Norte e Oeste das muralhas.

Na segunda fase da intervenção, realizaram-se obras de restauro e reconstituição do Castelejo ou Fortaleza; restauro de algumas muralhas da alcáçova; intervenções no piso térreo dos quartéis – antigo Paço da Alcáçova - composição de um conjunto de ruínas - possivelmente do Paço - e abertura de um percurso exterior às muralhas Norte e Oeste.




A intervenção no Castelo de S. Jorge foi avultada na medida em que a sua reconstrução foi geral, quase total e foi sustentada por critérios ideológicos onde verdadeiramente se operava com um espírito de reinvenção histórica, relegando para segundo plano a autenticidade do restauro, procurando-se antes de mais fabricar símbolos, mesmo sendo falsos. Ou seja, esta operação de restauro “seria devastadora, fruto do cariz exemplar que lhe foi atribuído pelo regime” (Correia, 2010, p.403) e modificou em grande escala o tecido urbano envolvente, sendo demolidos vários edifícios do quartel e reaproveitados alguns vestígios de construções anteriores.

As obras efectuadas foram exaustivas e incidiram numa primeira fase sobretudo em escavações e demolições que retiraram da área de intervenção um total de entulho estimado em 120.000 m³, sendo que em alguns casos as escavações atingiram profundidades de 8 metros.

O restauro ou reconstrução do Castelo seria a segunda fase da intervenção, sendo que não se pretendia somente uma reconstituição do edifício. Era necessária a valorização do objecto arquitectónico para que este se transformasse em espaço público.




A intervenção no Castelejo incidiu na demolição das edificações existentes no seu interior, libertando os seus dois pátios de qualquer edifício, para posteriormente se reconstruírem os adarves; as ameias e as seteiras seguindo o modelo dos vestígios encontrados, assim como as torres e as muralhas que ameaçavam ruir.

Toda a área monumentalizada do Castelo seria significativamente alterada, devido à utilização de um conceito de restauro integral que conduzia a reconstituições hipotéticas dos edifícios, pois que “a norma adoptada nos trabalhos de restauro foi baseada no aproveitamento criterioso dos vestígios descobertos nas demolições e metodicamente conduzidas, os quais serviram de modelo para as partes idênticas a restaurar ou fazer de novo” (Silva, 1960a, p. 382).

A única torre construída de novo foi a do muro divisório interior, “como se imaginou que seria primitivamente” (Silva, 1960a, p.385) sendo que se desentaipou a porta de ligação aí existente.






As fissuras na muralha são a maior ameaça para o castelo, sendo que ao longo do tempo houve diferenças abordagens construtivas para resolver o problema:


Continuando na época medieval, do castelo podemos ter uma boa perpetiva sobre Lisboa, e, apesar de não estar muito explícita, da sua muralha medieval, sobretudo o troço designado por Cerca Fernandina construído entre 1373 e 1375 [3] e que podemos ver nesta gravura de 1598:

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Da Porta da Mouraria até à Torre do Jogo da Pela está hoje a Praça do Martim Moniz, no entanto houve a iniciativa de construir um repuxo que nos remete para a muralha que atravessava o local. Logo acima, em frente de um relvado, foi recentemente exposta a Torre do Jogo da Pela, que até recentemente estava integrada no edificado. No canto superior direito podemos ver a Torre da Santana, à esquerda de uma chaminé em tijolo. Entre as duas torres ainda conseguimos identificar os topos de vários troços da muralha. 


Por fim, uma palavra para as ruínas de uma casa islâmica que foi encontrada há pouco tempo dentro do Castelo de São Jorge, que ainda conserva fragmentos da pintura original:


Para conservar estes frescos foi adotada uma solução que se integra perfeitamente no contexto museológico, ao reconstruir-se a volumetria integral do espaço original através de uma estrutura em aço:

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Foi posteriormente revestida, permitindo aos visitantes conhecer a morfologia original do conjunto exposto, que de outra forma seria apenas um aglomerado de calhaus.


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